terça-feira, 26 de abril de 2011

Parte II - Conversa Séria


No ônibus, todos os passageiros, menos Bina e a jovem fumante, empenharam-se em uma conversa séria, apropriada para aquela hora.
Depois de alguns quilômetros rodando em uma estrada poeirenta e esburacada, a primeira parada.
O cobrador desceu para colocar no bagageiro os arreios do peão, que fizera sinal para o ônibus parar.
Um homem moreno entrou, era um cavaleiro sem montaria, estava vestido com indumentária própria para trabalho pesado com o gado, mantinha amarrado na cintura um tirador surrado que ostentava diferentes marcas negras feitas com ferro em brasa.
João, o velho granjeiro, alinhavou uma prosa com o recém chegado:
– Bom dia, meu rapaz! Voltando das lidas campeiras da semana?
– É, estava marcando o gado do coronel Pavão.
– Vi teu irmão mais novo, o Tiago. Estava armado, andava caçando. Ainda brinquei com ele, disse: tamanho homem caçando, isso é coisa de guri pequeno que não tem o que fazer. Ele não me respondeu.
– É mania! – respondeu o recém chegado sentando no banco ao lado – Ele e o Mano Velho do finado Antônio, rasparam tudo: mato, campo e toca. O que era bicho eles caçaram: tatu, capivara, lebre, preá, jacaré, pomba – continuou o peão.
Nova parada interrompeu a conversa.
Uma senhora, de uns oitenta anos ou mais, e uma mulher jovem e forte com um filho dormindo nos braços entraram no ônibus. A cabeça loira estava recostada no ombro da mãe e da boca aberta escorria uma baba cristalina.
Ambas andaram pelo corredor do ônibus até sentaram lado a lado nos últimos bancos. O menino acordou e chorou quando a mãe sentou-se, mas esta logo lhe deu o seio, sossegando a criança.
– Então, dona Maria, andava lá no Pedro? Quem haveria de dizer, não é dona Maria? Aquela traidora! Uma criatura nascida e criada entre a gente. Quem poderia imaginar uma coisa dessas? – perguntou a mãe do menino num só fôlego para a velha senhora.
– É triste! – respondeu a velha senhora.
– Abandonar tudo desse jeito. Deixar o marido e a filha mocinha. Dizem que a menina não quis ir quando ela mandou buscar!? Rica filha! Na certa ficou com pena do pai, largado pela mãe. – continuou a mãe do menino.
– Pois é! – respondeu a velha senhora.
Por um tempo, silêncio... Quebrado pela voz do cobrador:
– São dois reais até Campo Limpo, senhoras.

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